Sabrina: “passei mal na rua e ninguém se deu conta”

Por Lina Moscoso, Lisboa.

Sabrina Silva, 19 anos, brasileira, também se sente invisível no centro de Lisboa. Ela trabalha como garçonete em um restaurante perto do bairro do Marquês de Pombal. “Aqui eu percebi que é cada um por si. Várias vezes já aconteceu comigo de estar passando mal na rua e ninguém dar conta. Pode até se dar conta. Mas, não se envolve. Pode até ser por eu ser negra, por eu não estar com uma roupa de grife, bonita”, reflete apontando também a questão do racismo como um problema social que impõe barreiras ao seu direito de bem-estar em Portugal.

Sabrina conta que sofreu racismo e xenofobia no restaurante que trabalhava em Algés por causa do seu “modo” de falar “brasileiro”. “Tive uns contratempos e pedi para sair. Sofri racismo duas vezes por cliente. Como eu cheguei em Portugal, por mais que eu tenha morado aqui quando era criança, voltei agora, não recordava de algumas palavras que se fala aqui, e algumas palavras que se fala no Brasil não são bem vindas aqui”, narra. Ela revela que no início era muito difícil porque falava do “seu jeito”, ou seja, a mesma língua portuguesa que é falada em Portugal, mas na versão brasileira, e para os clientes era uma ofensa.

A garçonete está há um ano e dois meses em Portugal. Escolheu migrar aos 19 anos com o objetivo de conseguir uma vida melhor para ela e para a família que deixou no Brasil. “Eu saí da casa dos meus pais com 17 anos, vim para cá com 18, sozinha, deixei família, mãe, pai e irmãos. Eu sou a irmã mais velha. Saí com 18 anos em busca de um futuro melhor enquanto eu sou nova”, justifica.

Exploração e ausência de garantia dos direitos trabalhistas

Tinha apenas cinco dias de Lisboa e já conseguiu o primeiro emprego num restaurante em Algés, que ficava perto da sua casa. Nesse estabelecimento Sabrina trabalhou durante 4 meses. “Era um trabalho muito cansativo e desvalorizado”. Em Portugal, a precarização é outra questão social grave. Problema que afeta sobretudo os imigrantes que muitas vezes precisam aceitar baixos salários, exploração e ausência de garantia dos direitos trabalhistas porque tem que sobreviver. Com Sabrina não foi diferente. “Demoraram 3 meses, quase 4 para me darem o meu contrato de trabalho, quando deram, eu pedi para sair porque o jeito como eles tratavam os funcionários era desumano”, desabafa. Depois disso, a atendente de mesa ficou quase um mês em casa desempregada, mas logo a seguir conseguiu o emprego que está hoje, onde está trabalhando há 10 meses. “É um trabalho cansativo por causa da rotina”, acrescenta.

Sabrina também tem que lidar diariamente com os problemas que envolvem os transportes públicos porque mora em Brandoa, distrito da Amadora, zona periférica de Lisboa, e precisa pegar dois transportes para chegar ao trabalho. Gasta 5 minutos até o ponto de ônibus, mas lá tem que estar à espera do transporte por uma hora. “Como são poucos, às vezes passam muito cheios, então eles nem param. Temos que esperar o próximo. E ali ficamos”. Sabrina precisa estar no trabalho às 11h30, portanto tem que sair de casa às 9h, no máximo às 10h, por causa dos imprevistos. “Entro no trabalho às 11h30, saio às 15h30, depois faço essa mesma rotina: pego dois transportes, vou lá na minha casa, busco os meus primos na escola, deixo em casa, pego mais dois transportes e volto. Dois transportes mais com esse tempo de espera. São três horas de intervalo, mas com a correria não dá tempo para descansar”, descreve. No final do dia, Sabrina volta ao trabalho às 19h e sai às 23h30 ou 23h40 e, às vezes, à 1h da manhã. Na volta para casa, o patrão de Sabrina paga um Uber se passar da meia noite meia.

Essa jornada diária acaba por provocar cansaço físico e psicológico. “E infelizmente temos sempre que estar com sorriso no rosto e fingir que está tudo bem para manter o nosso emprego porque a renda é cara, no supermercado está tudo encarecendo, transporte, roupa. O custo de vida está aumentando”, lista. Para completar a rotina da semana, Sabrina ainda realiza trabalhos extras na sua folga aos sábados – faz faxina em casas particulares em Santos, Lisboa – e domésticos na casa onde vive com duas tias e primos.

Sobre a vida que leva hoje, Sabrina tem esperanças que um dia melhore e costuma dizer que essa luta tem que ser travada agora enquanto é nova. “Eu prefiro lutar enquanto eu estou nova e conquistar alguma coisa: ter minha casa, ter meu próprio trabalho. Ser independente financeiramente. Lutar para conquistar isso futuramente. Quando eu chegar numa certa idade não terei mais essa força e esse vigor que eu tenho hoje e, portanto, já terei onde me refugiar”, idealiza. 

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