Atacante lidera a campanha histórica de Guiné Equatorial e tem números melhores que craques consagrados da Copa Africana de Nações
`Por Lucas Ayres
Esqueça Osimhen, Salah, Hakimi. O grande nome da Copa Africana de Nações 2023 não joga em um gigante do futebol europeu, muito menos em uma tradicional seleção do futebol africano: estamos falando de Emilio Nsue, destaque da Guiné Equatorial.
Aos 34 anos, o atacante, que curiosamente também joga como lateral, surpreendeu e roubou a cena na fase de grupos da CAN. Anotou cinco gols, se isolou como artilheiro da competição até aqui e liderou os Nzalang à primeira posição do Grupo A.
Foi a primeira vez que a seleção da Guiné Equatorial terminou na ponta da primeira fase da Copa Africana. E olha que ela jogou contra a Nigéria, que se classificou na segunda posição, e a anfitriã Costa do Marfim — a outra representante dos PALOP do grupo, Guiné-Bissau, ficou com a última colocação.
Nsue, claro, é um dos grandes motivos para o feito histórico. Capitão e camisa 10 dos “relâmpagos” (tradução livre do fang para Nzalang, apelido da seleção), o jogador foi a grande referência da equipe, que fechou o grupo A com duas vitórias, um empate, três gols sofridos e nove marcados.
O atacante, então, foi responsável por mais de 50% da produção ofensiva do time do técnico Juan Micha. Boa parte dela aconteceu em um só jogo, no “embate das Guinés” da segunda rodada, quando a Equatorial venceu a Bissau por 4 a 2.
Nessa partida, Nsue anotou três gols. De quebra, se tornou o mais velho jogador a anotar um hat-trick na Copa Africana de Nações, segundo o site de estatísticas Squawka — foi também o primeiro hat-trick na competição desde 2008.
Na partida seguinte, mais uma goleada, mais um show do camisa 10. Um 4 a 0 e com dois gols dele, mas dessa vez em cima de ninguém menos que a anfitriã Costa do Marfim.
Contra a Guiné (Conacri), nas oitavas, Nsue terá o desafio de manter o bom momento, mas dessa vez com os holofotes em cima dele, algo que ele não está exatamente acostumado. Pelo menos não nos últimos anos.
Em 17 anos de carreira até aqui, toda ela feita no futebol europeu, Emilio Nsue atuou na elite, isto é, nas chamadas cinco principais ligas europeias (Inglaterra, Espanha, Itália, França e Alemanha) em apenas cinco temporadas.
Dessas cinco, uma foi a sua estreia como profissional, em 2007, pelo Mallorca-ESP, em que atuou poucos minutos e um par de partidas na LaLiga; e outra foi sua última, em 2016, pelo Middlesbrough-ING, onde esteve em campo na Premier League em apenas quatro oportunidades.
A desventura na elite europeia não impediu Nsue de ter uma carreira prolífica. Jogou mais de 500 partidas profissionalmente, entre clubes e seleção. Anotou mais de 60 gols e distribuiu mais de 20 assistências, segundo o Transfermarkt.
Conquistou dois títulos nacionais pelo Apoel, do Chipre, outro da segunda divisão espanhola pelo Real Sociedad, e mais duas taças da Eurocopa pela seleção de base, veja só, da Espanha, na geração que revelou algumas figuras de destaque no futebol europeu, como Thiago Alcântara (Liverpool) e David De Gea, ex-Manchester United.
O período nas seleções espanholas de base não é coincidência. Emilio Nsue é nascido em Palma, município da ilha de Maiorca, e fez toda a carreira juvenil nas canteras do Mallorca, o clube local de maior sucesso.
Antes mesmo de estrear como profissional, já fazia parte da seleção sub-17 da Espanha, em 2006, e se manteve no ciclo das equipesnacionais espanholas até 2011.
Naquela altura, entre os 21 e 22 anos, era primariamente um ala direito, que podia atuar mais ofensivamente, como um meia, ou mais defensivamente, como um lateral. A versatilidade o fez ser peça-chave do Mallorca, onde se manteve até 2014, e também o fez receber o convite para atuar pela seleção de Guiné-Equatorial, país no qual nasceu seu pai.
Vendo a alta concorrência na geração campeã de duas Eurocopas e uma Copa do Mundo na Espanha, Nsue topou o convite e, em março de 2013, fez sua primeira partida pelos Nzalang, contra Cabo Verde, nas Eliminatórias para a Copa do Mundo de 2014. Jogou como meia esquerda, e o jogo terminou com a vitória dos Tubarões Azuis por 3 a 0.
Em pouco tempo, Nsue ganhou protagonismo nos Relâmpagos. Passou a usar a braçadeira de capitão na maioria dos jogos, tornou-se primariamente atacante — ainda que seguisse atuando em outras posições, chegando a jogar até como zagueiro em uma partida em 2021, contra a Tunísia — e trilhou o caminho para se tornar a referência da seleção.
A carreira por clubes, por outro lado, não despontava como o imaginado. Do Mallorca, se transferiu para o Middlesbrough em 2014 e foi peça-chave no acesso da equipe para a Premier League, a primeira divisão do Campeonato Inglês, em 2016.
Dali em diante, porém, perdeu minutos no Boro, se transferiu para o Birmingham, também da Inglaterra, e depois iniciou uma peregrinação pelo futebol europeu — com direito a passagens no Chipre e na Bósnia-Herzegovina — que terminou no atual clube, o Intercity de Alicante, hoje na terceira divisão do Campeonato Espanhol.
História na CAN 2023, história pela Guiné Equatorial
O destaque de Emilio Nsue na Copa Africana de Nações é quase um alento a um jogador que não conseguiu atingir as expectativas de sua promissora carreira, uma última oportunidade de brilhar nos grandes palcos — ainda que, aos 34 anos, tenha idade para, na teoria, pelo menos jogar mais duas edições da CAN, que são disputadas de dois em dois anos.
O fato é que, mesmo que a Guiné Equatorial não consiga passar da Guiné, Nsue já fez história, seja pela competição, seja pelo seu país. No mínimo ajudou a dar um descanso para os trabalhadores da nação que defende: o presidente Teodoro Obiang, afinal, decretou feriado nacional após a goleada dos Nzalang sobre a Costa do Marfim.