Moda e ativismo

Syn Wear, marca da moçambicana Juliana Penne une design, arte, música, skate e principalmente comunidade

Por Marcelo Ayres

Foto: Enzo Sinai.

Juliana Penne tem 29 anos, mas já percorreu um longo caminho. Nascida em Moçambique, já viveu no Brasil, Portugal, Dinamarca e atualmente está em Mônaco. Uma pessoa do mundo como sua avó costuma dizer. Juliana fez graduação em serviço social e sempre teve muito apreço em trabalhar em projetos sociais. No entanto, nos últimos anos começou a se interessar muito em aprender com a indústria da moda e a partir daí decidiu criar um projeto que conjugasse essas componentes e também a questão artística e o ativismo.

“Então eu comecei a Syn Wear em meados de 2023. Eu decidi juntar estes pilares que me atraem em um só projeto e tudo começou através de uma conversa entre amigos. Eu estava a comentar com um grande amigo meu de infância, ele é designer e na altura já lhe tinha partilhado este gosto por criar um projeto, mesmo que fosse um negócio”, conta Juliana. Em suas reflexões ela analisava que “a indústria da moda e mentalidade empresarial, hoje em dia é muito egocêntrica. É muito focada naquilo que é o sucesso da própria pessoa ou sucesso da própria marca, mas esquece-se muito, de quem faz o sucesso é a comunidade. Então eu decidi que gostava de criar algum projeto que desafiasse essa mentalidade”, completa.

Juliana Penne criadora da Syn Wear.

Para Juliana é necessário que a indústria da moda esteja mais focada em desenvolvimento comunitário, “porque também temos as questões, por exemplo, do ‘Fast Fashion‘, que são as roupas que são produzidas na China, que não são produzidas com materiais orgânicos e depois isso tudo afeta, principalmente os países mais pobres”. Como moçambicana Juliana ressalta que tem completamente noção do quanto essas indústrias acabam por afetar Moçambique e muitos outros países. “Também trabalhei e vivi muito próximo de pessoas que estão nessa área da moda. Então deixa-me sempre assim com um aperto no coração, não é, por viver entre dois mundos, entre duas realidades”, conta a jovem empreendedora.

Das conversas com seu amigo Juliana decidiu que queria mesmo começar essa missão. “Então decidi criar este projeto com os pilares de ativismo ou ‘artevismo’, ou seja, criar arte com uma mensagem, e depois a questão da sustentabilidade, sem dúvidas, porque é importante termos agora muito mais cuidado com o nosso planeta e com as opções que nós fazemos”, explica.

Foto: Juan Alvarez.

Um terceiro pilar que compõe a base da Syn Wear é o desenvolvimento comunitário, que para ela é a necessidade de colocar em prática e dar à comunidade aquilo que nós acabamos por receber.

Coleções que apoiam projetos

A Syn Wear vai com cada coleção que monta ajudar um projeto diferente. “Basicamente o que nós fazemos é termos artistas que queiram colaborar conosco, que podem ser designers pintores, ilustradores e depois nós ajudamos este designers a criar uma coleção”, explica Juliana. A marca dá apoio financeiro e de marketing e também auxilia na criação das peças que sejam sustentáveis. Um exemplo é a coleção de camisetas criada por Pedro Clemente. “Fizemos uma coleção com o Pedro, que fez estas camisetas com estampas baseadas em artistas inspiradores, que também trazem alguma mensagem e que tiveram muita influência na música e que influênciaram muitos em artistas hoje em dia. Acho que isso também é uma forma de ativismo que é ter e demonstrar apreço pelos artistas que nos inspiram”, completa.

Como explica Juliana as camisetas desta coleção são feitas em algodão orgânico em Portugal. No entanto, mesmo sendo as vestimentas o principal da marca, ela não vai se prender a ter somente este tipo de produto. “Podemos fazer outras peças completamente diferentes. Depende muito do artista e da sua identidade”, ressalta.

Apoiando o skate

Outra paixão de Juliana é o skate. “A comunidade do skate é uma comunidade muito forte, muito unida. Foi assim que senti que queria ajudar algum projeto que tivesse a ver com o skateboarding porque eu gosto muito de andar de skate”, conta. Juliana já conhecia o projeto Maputo Skate, em Kongolote, Moçambique, há bastante tempo. “Eu já tinha muita vontade de poder ajudar de alguma forma e então decidi contatar o Francisco Vinho (criador do Maputo Skate) e fazer uma parceria para que conseguíssemos ajudá-lo a se desenvolver e também criar oportunidades para a geração futura, para que eles saiam de lá do projeto como profissionais ou a gostar ainda mais de skate”, explica.

O Maputo Skate é o primeiro projeto social que a Syn Wear apoia.

O foco da Syn Wear no momento é a Maputo Skate. No entanto, Juliana explica que está preparando para expandir, pois é preciso fazer as coisas bem acertadas e com bases sólidas para, como ela diz não parar no meio do caminho. Entre outros apoios ela já fez voluntariado há alguns anos em um campo de refugiados na Grécia, que se chama “Spring Movement”. no qual eles também ensinam skate. “Então eu ajudava as crianças que viviam lá a aprenderem a andar de skate”, relembra.

Juliana também está em contato para uma possível parceria com um projeto de skate no Brasil na cidade de Suzano, próxima de São Paulo, criado pelo skatista Davison Fortunato, também fundador do Skate Suzano. “O Girls Skate Jam está a fazer muita diferença na comunidade de skate no Brasil com esse projeto, que ensina meninas a andar de skate e apoiam estas meninas no mundo do skate. Apoio é muito importante para as meninas que gostam do skate”, completa.

Yasmin, skatista brasileira é a primeira atleta patrocinada pela Syn Wear no Brasil.

Investindo no skate feminino brasileiro

A Syn Wear tem agora sua primeira skatista patrocina no Brasil. Yasmin Cristina, conhecida no mundo do skate como “Gnoma” acabou de acertar com a Julliana patrocinio da marca.”A Yasmin, a quem estamos a começar a fazer patrocínio é uma skatista muito boa e tem muito talento. Ela precisa de apoio e estamos a começar a fazer patrocínio para que ela participe de competições,. possa treinar com mais recursos. Já mandamos umas peças também para que ela possa divulgar a marca lá no Brasil e com trabalhar para que ela chegue longe assim a ver”, completa.

Yasmin agora tem possibilidades de sonhar mais alto.

Yasmin tem 19 anos e anda de skate desde os 6 anos. Sua vida é toda dedicada a este esporte e a essa comunidade. Ela é de Suzano e participou da primeira Girls Skate Jam na cidade. O evento dedicado completamente ao universo feminino, teve participação de vários coletivos de skatistas mulheres. “Conheci a Juliana Penne e a marca Syn Wear e me indentifiquei com a ideia de como se conectam com o skate e como inspiram outras pessoas”, conta Yasmin.

Ela entrou em contato com a Juliana pelo Instagram e a identificação foi recíproca. O acordo com a Syn Wear vai ampliar a preparação de Yasmin. “Esse patrocínio é importante para mim, pois era algo que eu queria muito ter para que eu me juntasse a pessoas com o mesmo intuito de trazer o skate, para o mundo de uma forma comunitária, com conceito de sustentabilidade e serviço comunitário e assim poder ajudar mais pessoas a entender que o skate também é uma ferramenta de criação. Skate salva e o skate me salvou!”, finaliza Yasmin.

Ações pelo mundo

Juliana explica que a Syn Wear está aberta a conhecer novos projetos e comunidades e a partir daí ver a melhor forma de gerar apoio. Ela e o Pedro Clemente já conheciam e gostavam do Maputo Skate e isso acelerou o processo de parceria. “No entanto, se tivermos um artista que quer apoiar um projeto no Brasil nós obviamente havemos de fazer isso”, ressalta Juliana. Para ela não importa de onde venha o projeto e sim seus princípios.

“Esta plataforma é do mundo mesmo. O objetivo é que sejamos uma comunidade mundial. Que criemos raízes por todo o mundo, mas que também tenhamos sempre muito foco em ajudar e desenvolver países que precisam dessa ajuda, ou seja, para mim é muito importante apoiar artistas que são pequenos artistas, não tenho ambição de apoiar artistas que já estão no topo, porque não faria sentindo com os pilares que acreditamos para o projeto”, destaca.

Juliana explica que o Syn do nome da marca quer dizer visibilidade ou visão em dinamarquês. “O próprio símbolo, o “S”, que compõe a marca se parece com um olho. A ideia é dar visibilidade e dar visibilidade visionária. Eu acredito que há muitos talentos aí que estão perdidos e que não têm possibilidade ou oportunidade de poder expandir, porque não há apoio então nossa ideia é criar uma plataforma que seja um uma plataforma de empoderamento também para esses pequenos artistas”, completa Juliana.

Expansão

A Syn Wear teve início oficialmente em outubro de 2023. Este ano de 2024 é de consolidação das ações e expandir a marca. Uma das ações é ampliar o espaço no online, através do site da marca. “Iremos ter diferentes produtos e também vamos ter muito foco em ter uma espécie de blog, em que iremos escrever artigos sobre vários temas. Por exemplo, recentemente fechamos uma parceria com uma revista que se chama Betesga Magazine, que é portuguesa e é uma revista para meninas skatistas e o foco é o feminismo no skateboarding, a inclusão no skateboarding, a inclusão no mundo da moda, a questão da sustentabilidade, então temos assim vários temas que queremos abordar e queremos muito conscientizar as pessoas a pensar nestes temas”, conta.

Yasmin em ação.

Outras parcerias também estão sendo finalizadas. “Temos uma parceria com uma marca dinamarquesa/japonesa que faz uns brinquedos japoneses chamados “kendamas” que vamos trazer para a Syn Wear. Uma nova coleção está sendo preparada pelo ilustrador português, Lourenço Providência, que faz muitas ilustrações para o New York Times”, explica. Juliana também destaca que vai investir em alguns designers para que eles possam criar coleções para concursos de moda.

Já com a Betesga Magazine, Juliana tem em mente fazer um evento no Dia da Mulher, em março. “Vai ser uma skate jam, que vamos ter um skate park todo para nós, e aí vamos celebrar o Dia da Mulher com skate que acho que é uma coisa fantástica”, comemora, Juliana.

Outro projeto mais ambicioso de Juliana é o que aborda a saúde mental e o skate. “Estou a tentar criar um um evento, no qual seja possível falarmos sobre a saúde mental e o skateboarding porque há muitos skatistas que acabam por começar a andar de skate, para se distrair de problemas que enfrentam e isso tem uma grande influência na saúde mental. Gostava muito de fazer isso, uma roda de conversa com alguns profissionais e pessoas que estejam interessadas”, explica. Nesse evento Juliana quer também tratar da questão do feminismo no skateboarding e a questão da inclusão social do skateboarding.

“Estamos muito abertos a tudo o que for possível para ajudar, agora é tentar fundamentar e criar as raízes nestas pequenas coisas que já estamos a fazer, para fazer sempre”, finaliza.

Foto: Juan Alvarez.