Enteado da língua portuguesa

Por Beni Dya Mbaxi.

Aproveito este espaço para dizer que ainda não sei falar português, e nem sei quando aprenderei, sou de uma zona onde a língua portuguesa teve de usar outras roupagens, bem dizer, teve de coabitar com uma outra língua, ela encontrou nas gargantas das velhas e dos velhos cansados que repousavam os corpos nos primeiros musseques de Luanda, uma outra língua aquela que eles poderiam dizer tudo, absolutamente tudo! Lembro a minha avó quando dizia para mim, que não gostava de falar português, o estranho é que alguns a percebiam, mas ela afirmara que, aquelas não eram as palavras que almejava, mas ela não sabia que estava a ser compreendida, e disse que mais tarde, começou a falar um português arranhado e misturado com Kimbundu, ela nem tinha na altura a noção que mais tarde nasceria uma cria linguística, que hoje alimenta os neo-mussequeiros, contudo, que eu dizer que a minha avó não era a única que estava a dar vida a uma outra forma de falar português. Nem mesmo os portugueses sabiam que viria a nascer uma nova forma de se comunicar. Quando cheguei ao mundo, encontrei uma maneira diferente de falar português, na verdade, é uma herança linguística!

Neste pouco tempo que estou neste mundo, lembro que a minha avó falava comigo de várias formas, momento algum já pensei que o português por si só nos musseques não existe, penso que nós que nascemos depois da minha avó e da minha mãe, falo da minha geração, também temos muitas formas de se comunicar, a minha avó falava uma coisa em Kimbundu e, no final, colocava um pouco de português, hoje, usamos o Kimbundu, português, calão e, no final, neologismo. Portanto, nem muitos perceberem a língua portuguesa no lugar em que habito, ela não é 100%, nós tivemos uma necessidade de ser compreendido, e acabamos por usar tudo que é mecanismo para ser entendido, com este texto, apresento aqui a minha ousadia e aviso que a língua portuguesa no lugar que habito não é 100%, ainda acho que a minha avó queria dizer que a nossa língua mãe são as nossas línguas nacionais e as variações linguísticas o pai, mas não contavam que surgiria uma outra língua que seria o padrasto, hoje, nós, os neo-mussequeiros, somos enteados da língua portuguesa. Por isso, digo, eu ainda não sei falar português, e não sei quando aprenderei!