Por Jamil Chade.
O governo brasileiro lança uma ofensiva diplomática para promover a língua portuguesa no exterior e um dos focos será a busca por um espaço nos organismos internacionais, principalmente na ONU.
Brasília considera que, sendo o português a língua mais falada no hemisfério sul, seu lugar no mundo faz parte do reposicionamento do país no debate internacional, principalmente depois de quatro anos de isolamento.
De acordo com o Itamaraty, a estratégia de promoção passou a figurar, a partir de 2023, como uma das “linhas de ação prioritárias” do Programa de Diplomacia Cultural do Instituto Guimarães Rosa, o antigo Departamento Cultural da chancelaria brasileira.
Entre as medidas, o governo prevê ações simbólica e também medidas concretas de ensino, tradução e lobby para que o idioma possa fazer parte da agenda de trabalho da diplomacia mundial.
Uma dessas iniciativas é a instrução para que as delegações brasileiras no exterior organizem celebrações para o Dia Mundial da Língua Portuguesa, criado em 2019. Neste ano, uma delas ocorreu em Genebra, pela missão do Itamaraty perante a ONU.
O Brasil também passou a oferecer cursos de português para funcionários de organismos internacionais. Isso inclui até mesmo curso de língua e de cultura brasileira para os funcionários do secretariado da Associação das Nações do Sudeste Asiático (ASEAN).
“A iniciativa surgiu durante a campanha do Brasil para tornar-se parceiro de diálogo setorial da ASEAN. Com a entrada de Timor na Associação em 2022, como o 11º. Membro pleno da Associação e única nação asiática que tem o português como língua oficial, a iniciativa mostrou-se ainda mais oportuna”, destaca o Itamaraty.
O público-alvo do curso é composto por funcionários dos países asiáticos e, de acordo com o governo, o próprio Secretário Geral adjunto da ASEAN é um dos matriculados. “Para incentivar a participação, foi oferecida viagem-prêmio ao Brasil ao aluno melhor classificado no curso. A procura superou as expectativas e foi preciso abrir uma segunda turma”, relata o governo.
Na Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), a meta do Brasil é a de ampliar sua atuação no Instituto Internacional da Língua Portuguesa (IILP), órgão vinculado à comunidade.
A ideia, para os próximos meses, é ainda a de conseguir que outros organismos internacionais passem a adotar o português como língua de trabalho. Um dos focos é o de garantir o reforço do status especial do idioma na Organização Mundial da Propriedade Intelectual pelo reforço do status especial da língua portuguesa, com a meta de se alcançar a condição de língua de trabalho. Uma carta foi enviada à direção da entidade, reforçando esse apelo.
O modelo no qual o Itamaraty toma como base é o da Unesco. Desde 1985, o idioma é uma das nove línguas oficiais da Conferência Geral da UNESCO. Nos últimos anos, o Itamaraty ainda tem feito ações para promover a língua portuguesa tanto nas reuniões de trabalho da Organização, quanto nos programas desenvolvidos pela UNESCO.
Mas, mesmo dentro do organismo, os esforços continuam. Entre as medidas adotadas recentemente estão as ações para estimular o aumento do número de lusofalantes nos secretariados, encorajar o uso da língua portuguesa em reuniões de trabalho, estimular parcerias com interlocutores lusófonos, e desenvolver políticas de mulitinguismo que contemplem o português.
Em março deste ano, o Brasil ainda financiou a tradução da reunião da Convenção para a Salvaguarda do Patrimônio Imaterial, realizada em Argel. “Graças aos recursos brasileiros, a reunião foi inteiramente traduzida ao português, permitindo a técnicos e especialistas, sobretudo dos Países Africanos de Língua oficial Portuguesa (PALOP) participar da reunião com maior naturalidade”, afirmou o Itamaraty.
A Delegação do Brasil também apoiou a tradução de documentos técnicos para o português e vai estimular uma maior presença de arquivos em língua portuguesa no âmbito do Programa Memória do Mundo, que registra os documentos mais preciosos da humanidade.
“O Itamaraty apoiou a realização de seminário realizado pela UNESCO no Rio de Janeiro com vistas a incrementar a capacidade de gestores de arquivos dos países da CPLP e, com isso, permitir-lhes aceder ao Programa Memória do Mundo”, revelou o governo.
Para 2024, o Itamaraty destaca que dois projetos terão como meta ampliar a presença do português na Unesco.
O primeiro é a exibição de mostra do Museu da Língua Portuguesa dedicada à importância das línguas indígenas para o português brasileiro. “A mostra permitirá ao Brasil não apenas trazer à UNESCO uma instituição cultural de alto nível como tocar temas relacionados ao convívio entre línguas maternas e ao diálogo intercultural”, explicou o Itamaraty.
Outro projeto, desenvolvido no marco do Dia Mundial da Língua Portuguesa, é uma discussão sobre o papel do idioma nas economias criativas, particularmente relacionadas ao audiovisual. A meta é a de mostrar políticas públicas de fomento à produção de material audiovisual em língua portuguesa, incluindo coproduções com Portugal e com outras organizações internacionais, como a CPLP.
O governo ainda quer manter sua ofensiva na pauta da diversidade linguística em ambiente virtual.
A Delegação do Brasil na Unesco sugeriu uma decisão que promove o multilinguismo em ambientes virtuais no marco da Assembleia da Convenção para a Promoção e Proteção da Diversidade das Expressões Culturais.
“Trata-se de discussão central em vista do avanço vertiginoso da inteligência Artificial que se ampara, sobretudo, em mecanismos de língua inglesa para a busca, produção e promoção de conteúdos virtuais”, destacou.
Na avaliação do governo a Unesco serve como uma espécie de laboratório para verificar como a língua portuguesa pode estar mais presente em uma entidade da diplomacia mundial. Mas também um laboratório para avaliar como os organismos internacionais podem ajudar na promoção do idioma pelo mundo.